Uma garota de programa paulista de 29 anos descobriu como fazer valer a pena viajar para Brasília para atender seis clientes – entre políticos e empresários – depois de criar uma personagem inspirada em deusas gregas. Preferindo manter a identidade em segredo, a mulher tem aproveitado os protestos pró e contra Dilma para cobrar mais atenção do poder público à profissão de prostituta.
A jovem conta que começou a trabalhar na área há quatro anos e por opção.Ela afirma ganhar cerca de R$ 30 mil por mês sob a alcunha de “Spartana Hera”. O dinheiro a permitiu trocar a vida simples por viagens e ajudas regulares aos pais, além de carro e casa próprios.
“Sempre gostei de sexo e, quando digo isso, é num nível alto, podemos considerar uma porta para a profissão. Não quer dizer que todas gostam assim, mas eu tenho essa sorte. E, claro, também pelo dinheiro. Só uni o útil ao agradável”, afirma. “Sempre pensei como uma opção de vida, nunca julguei de forma ruim ou tive olhos preconceituosos.”
Hera trabalhava na compra e revenda de roupas, maquiagem e sapatos. O salário era de R$ 2 mil. A jovem decidiu então apostar no próprio corpo como produto e passou a atender em uma casa de massagens. Ela diz ainda se lembrar da primeira experiência.
“Foi estranho, mas, ao mesmo tempo, gostoso. Eu estava nervosa e apreensiva por quem poderia ser esse primeiro cara. Me lembro dele, sim, foi muito paciente e educado”, detalha. “Conheci ele somente na sala reservada. Um homem muito elegante, cheiroso, e não foi o melhor nem o pior programa. Na época recebi R$ 350 por uma hora.”
A mulher conta ter trocado a clínica pela personagem para melhorar o trabalho e ter qualidade de vida. Como deusa grega, ela diz conseguir atender em dias e horários em que ela escolhe e em locais mais seguros e confortáveis. A jovem não tem mais preço fixo por cliente.
Além de ter clientes no Distrito Federal, Hera também viaja para serviços no Rio de Janeiro, Paraná, Santa Catarina e Bahia com frequência. Ela faz em média três atendimentos por dia. Em épocas “muito boas”, a mulher afirma dobrar o trabalho. A jovem diz não ter restrição e atender tanto homens quanto mulheres. A garota de programa também atende com uma amiga, quando solicitado.
“Viajo bastante, mas só com clientes que já conheço há algum período, por segurança mesmo. Essa ‘seleção’ [de clientes] sempre será um risco, mas faço diversas perguntas antes, vejo fotos, e mesmo assim não é nenhuma garantia, esse é o risco que toda garota corre”, explica.
Segundo a garota de programa, a maioria dos clientes quer sexo e realização de fetiches. “Outros são bem carentes, querem carinho e atenção. Não sei se posso relacionar os papos com psicologia, mas rolam muitos desabafos e confissões de frustrações e fraquezas que escondem das esposas e família. Eu apenas ouço com atenção e faço meu trabalho.”
O primeiro contato costuma acontecer justamente em viagens de negócios dos clientes a São Paulo. Os clientes mais antigos têm prioridade no atendimento, justamente por já serem conhecidos, pagarem “bem” e toparem arcar com os custos pelo restante do dia ou até da semana para ficar com Hera.
Luta
Carregando cartazes com mensagens como “Seja deputado ou puta, todo mundo precisa de respeito” e “Eu sou puta, mas o governo que fode todo mundo”, a jovem tem protestado em Brasília por mais segurança e garantias para a área. Ela faz referência ao projeto de lei 4.211/2012, do deputado Jean Wyllys (PSOL). A proposta ficou conhecida como PL Gabriela Leite – uma garota de programa que defendeu os direitos dos profissionais do sexo e chegou a fundar a ONG Davida – Prostituição, Direitos e Saúde.
Carregando cartazes com mensagens como “Seja deputado ou puta, todo mundo precisa de respeito” e “Eu sou puta, mas o governo que fode todo mundo”, a jovem tem protestado em Brasília por mais segurança e garantias para a área. Ela faz referência ao projeto de lei 4.211/2012, do deputado Jean Wyllys (PSOL). A proposta ficou conhecida como PL Gabriela Leite – uma garota de programa que defendeu os direitos dos profissionais do sexo e chegou a fundar a ONG Davida – Prostituição, Direitos e Saúde.
“Eu presto um serviço e não tenho garantias nenhuma. Precisamos primeiramente regulamentar a profissão e a partir daí muitas conquistas virão. As maiores reclamações são sobre a falta de segurança. Dados dizem que temos mais 1,5 milhão de pessoas trabalhando na prostituição no Brasil, e todas essas pessoas estão sem direitos previstos pela lei”, afirma.
Hera não contou se chegou a ser vítima de violência durante o trabalho, mas diz sofrer preconceito de forma indireta diariamente. “Normalmente ocorre em conversas com pessoas que não sabem que sou e acabam destilando suas maldades. Me sinto triste, não posso mentir, mas também me dá força para lutar no dia a dia. As pessoas precisam respeitar mais, o que faço com meu corpo não afeta a vida delas. Chega de nos colocarmos à margem da sociedade. Estamos no centro.”
Amigos próximos a apoiam no trabalho. “Acredito que as pessoas que mais se colocam à frente desse preconceito na sociedade são os que mais consomem nosso trabalho. Pode até ser uma forma de disfarçar os desejos.”
Ela conta que criou a personagem justamente para se resguardar e para poder preservar clientes. Rainha do Olimpo na mitologia grega, Hera era a deusa protetora do casamento, da vida e da mulher. A garota de programa diz que agregou o “spartana” por sempre ter se visto como “guerreira”.
“As roupas foram desenhadas por um amigo e confeccionadas por um estilista em São Paulo. A personagem foi criada para chamar atenção pela causa, ela é uma batalhadora que lutará por direitos da classe”, afirma.
Veja mais no G1/DF (Fotos: Spartana Hera/Divulgação) e Rodrigo Bueno
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