Rafaela
Felicciano/Metrópoles
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Fonte:
Estadão Conteúdo
A falta de chuvas de 2017 vai pesar no bolso dos
consumidores em 2018. Após um ano com um volume de afluências abaixo da média,
que levou a um elevado consumo de energia a partir de usinas térmicas, mais
caras, a tarifa de luz deve subir em um ritmo maior neste ano. E isso mesmo
considerando que o atual período chuvoso, iniciado em novembro, tem se mostrado
mais favorável. As projeções variam, mas os reajustes das tarifas de energia
devem superar os 10%, em média. Uma parcela significativa desse reajuste vem do
aumento do custo da energia, pressionado pelo déficit hidrológico (GSF),
estimam especialistas.
Pelos cálculos da Câmara de Comercialização de Energia
Elétrica (CCEE), o déficit hidrológico médio de 2017 ficou em 79%, o que
significa que as hidrelétricas geraram 21% menos do que o volume de energia que
tinham direito de comercializar. Para compensar a menor geração hídrica, foram
acionadas termelétricas, que produzem uma energia mais cara, gerando custo
adicional para o sistema. Esse custo deveria ser coberto pela receita
proveniente das bandeiras tarifárias, mas tendo em vista o alto preço da energia
de curto prazo registrado ao longo do ano, justamente pela geração térmica, o
valor arrecadado não tem sido suficiente para fazer frente às necessidades.
A Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) chegou a
elevar o valor da cobrança adicional com o acionamento das bandeiras, a partir
de novembro, e ainda liberou um recursos proveniente de um outro encargo, a
Conta de Energia de Reserva (Coner), de maneira a reduzir o descompasso entre
gastos e receitas. Ainda assim, a projeção é de déficit significativo. Pelas
regras do setor, quando a receita com as bandeiras tarifárias não é suficiente
para cobrir os custos, as distribuidoras arcam com compromisso e, no momento do
reajuste, o saldo dessa conta entra no cálculo da tarifa, de forma a zerar os
passivos.
Considerando os dados até novembro, a Aneel indicou um
saldo negativo de R$ 4,8 bilhões para compensação futura, por meio das
bandeiras tarifárias ou dos reajustes mensais. A estimativa da Associação de
Distribuidores de Energia Elétrica (Abradee) indica que o déficit das
distribuidoras com o custo hidrológico deve somar cerca de R$ 4,3 bilhões em
2017. A leve redução deve ser possível tendo em vista que em dezembro vigorou a
bandeira vermelha patamar 1, que adiciona R$ 3 a cada 100 KWh consumidos,
gerando receita para a Conta Bandeiras, ao mesmo tempo em que o déficit
hidrológico e os preços da energia de curto prazo foram menores que o de meses
anteriores.
No entanto, para janeiro, a Aneel definiu que a bandeira
tarifária é verde – sem custo extra para os consumidores -, reduzindo o
montante arrecadado na conta bandeiras. Com isso, o passivo a ser repassado
para as tarifas pode ser maior.
A consultoria Thymos Energia estima que as distribuidoras
que têm reajuste no primeiro semestre – empresas como Cemig, Enel, Light e
algumas concessionárias da CPFL, por exemplo – terão um reajuste entre 10% e
15%.
“O que vai acontecer é que esse saldo não vai ficar zerado
e esse acúmulo, bem acentuado por conta de GSF baixo com PLD alto, vai puxar a
componente de CVA”, explica o presidente da Thymos, João Carlos Mello,
referindo-se à Conta de Compensação de Variação de Valores de Itens da Parcela
A, um mecanismo que calcula as variações de valores de custos não gerenciáveis
(Parcela A) ocorridas entre reajustes tarifários anuais das distribuidoras de
energia. Na data do reajuste anual, se a CVA estiver negativa, há repasse desse
montante para tarifa Se a conta estiver positiva, o saldo é usado para abater o
reajuste anual das tarifas.
Diego Aspeé, consultor da Thymos, não descarta aumentos até
superiores aos 15% e lembra que o alto custo com GSF já penalizou os
consumidores das distribuidoras que têm reajuste no final do ano, como CPFL
Piratininga, Celg e EDP SP, que anotaram aumentos entre 15% e 24%,
influenciados também por outros fatores, como o início do pagamento de
indenizações às transmissoras. Para estas e outras distribuidoras com
aniversário de contrato no segundo semestre, ele considera que o ritmo de
reajuste dependerá do volume de chuvas nos próximos meses e do preço spot de
energia. “O viés é de alta, mas vai depender da janela de CVA. Pode haver uma
compensação, se o primeiro semestre for favorável”, diz.
A TR Soluções, empresa especializada na análise e cálculo
de estruturas tarifárias, projeta um reajuste médio das tarifas de energia de
9%, considerando 40 distribuidoras do País que respondem por cerca de 97% do
mercado brasileiro. Dentre as empresas com aumento nas contas de luz acima da
média nacional, segundo a empresa, estão as distribuidoras do Rio de Janeiro –
Light e Enel Rio (antiga Ampla), justamente as primeiras concessionárias de
grande porte a passarem por processos tarifários neste ano, em 15 de março. O
aumento estimado é da ordem dos 10%.
Mais otimistas, os analistas do Banco Santander estimam um
aumento médio de 5,9% nas contas de luz, no cenário base, considerando o
acionamento da bandeira vermelha patamar 1 ao longo de 2018, que levaria ao
equacionamento do passivo na CVA.
Para a equipe, em seu cenário mais otimista, a bandeira
amarela seria acionada em meados de 2018, o que poderia contribuir para um
reajuste de apenas 1,9% das tarifas, sempre levando em conta que não haveria
passivos a serem cobertos nos reajustes anuais. Neste cenário, o banco prevê
que os reajustes devem ser mais baixos nas distribuidoras com reajuste no
primeiro semestre e mais elevados para as concessionárias que têm aniversário
de contrato na segunda metade do ano.
Para a equipe de análise, o acionamento da bandeira verde
em janeiro antecipa o movimento de menor pressão tarifária já esperado por
conta da melhora da hidrologia, provocando um impacto positivo para o
consumidor. Embora considerem que o cenário mais provável ainda é de bandeira
amarela para 2018, os profissionais do banco passaram a trabalhar com a probabilidade
de que a bandeira verde seguirá válida por mais alguns meses.
Encargos
Além do custo com o déficit hidrológico, os especialistas
também citam os encargos setoriais como fator de pressão nas tarifas de
energia. No final de dezembro, a Aneel anunciou um aumento de 22,88% na Conta
de Desenvolvimento Energético (CDE), o que corresponde a um impacto médio nas
tarifas de 2,14%, com diferenças no peso da cobrança por regiões. Nas regiões
Sul, Sudeste e Centro-Oeste, o impacto será de 2,72%, e no Norte e Nordeste, de
0,77%, segundo cálculos da própria agência.
Mas a TR Soluções calcula que o impacto médio deve ser
maior, de 3,7% nas tarifas, chegando a 4,5% para consumidores das regiões Sul e
Sudeste-Centro Oeste. A consultoria explica que sua estimativa é superior à
divulgada pela Aneel porque a análise considera também o componente financeiro
do aumento no encargo, não apenas o econômico.
A TR lembra que haverá o impacto da retirada de componente
financeiro negativo nas contas da CDE, referente a um desconto dado da ordem de
R$ 10,00 por MWh, por conta de uma cobrança a maior, e que fica em vigor até o
evento tarifário de cada concessionária em 2018.