(Evaristo Sá/AFP |
O fundo eleitoral bilionário criado para bancar as
campanhas políticas com recursos públicos retirou R$ 472,3 milhões
originalmente destinados pelos parlamentares para educação e saúde neste ano.
Deputados federais e senadores, quando aprovaram a destinação de verbas para as
eleições, haviam prometido poupar as duas áreas sociais de perdas.
Levantamento feito pelo jornal O Estado de S. Paulo mostra
que o fundo receberá R$ 121,8 milhões remanejados da educação e R$ 350,5
milhões da saúde. O valor corresponde à transferência de dinheiro das emendas
de bancadas - que seria destinado a esses setores - para gastos com as
campanhas eleitorais deste ano.
O fundo, aprovado em 4 de outubro do ano passado, é uma
alternativa à proibição das doações empresariais e receberá, no total, R$ 1,75
bilhão. Desse montante, R$ 1,3 bilhão sairá das emendas de bancada, cujo
pagamento é obrigatório pelo governo, e R$ 450 milhões da isenção fiscal que
seria concedida a rádios e TVs para veicular programas partidários.
O dinheiro será distribuído aos partidos de acordo com o
tamanho de suas bancadas na Câmara e no Senado. A criação do fundo é contestada
por ação que tramita no Supremo Tribunal Federal (STF), sob a relatoria da
ministra Rosa Weber. Ela decidiu levar o caso ao plenário da Corte e ainda não
há data para o julgamento.
A verba retirada da saúde para abastecer o caixa das
campanhas seria suficiente, por exemplo, para arcar com a construção de 159
novas Unidades de Pronto-Atendimento (UPAs), com sete leitos, dois médicos e
atendimento médio de 150 pacientes por dia ou financiar 859 Unidades Básicas de
Saúde (UBSs).
Os recursos que deixaram de ser aplicados em educação
equivalem a 34% de todos os pagamentos que o governo realizou no ano passado no
Programa Nacional de Reestruturação e Aquisição de Equipamentos para a Rede
Escolar Pública de Educação Infantil (Proinfância): R$ 355 milhões, conforme
dados do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE). O dinheiro serve
para construir e equipar creches.
A Secretaria Estadual da Saúde do Espírito Santo perdeu,
por exemplo, R$ 15,7 milhões para a compra de ambulâncias. Em Goiás, o programa
Caminho da Escola, que compra ônibus e bicicletas para transporte escolar em
núcleos rurais e periféricos, não terá R$ 18,7 milhões.
Os principais articuladores da reforma política, quando a
proposta tramitou no Congresso Nacional, afirmaram que as duas áreas não seriam
prejudicadas. "Não aceito que mexa um centavo de saúde e educação",
disse à época o presidente do Senado, Eunício Oliveira (MDB-CE). Um dos
idealizadores do uso das emendas como fonte de recursos, o senador Romero Jucá
(MDB-RR), líder do governo Michel Temer, também rechaçou as perdas: "A
proposta que eu fiz não tira dinheiro da educação, da saúde, de lugar
nenhum". Procurados, eles não foram encontrados para comentar o assunto.
Outras
áreas
Além das verbas de saúde e educação, R$ 828 milhões foram
retirados de áreas como segurança pública, infraestrutura, obras contra a seca
e agricultura.
Com o remanejamento de emendas de outras áreas, deixarão de
ser comprados equipamentos operacionais e viaturas para a Polícia Militar do
Rio (R$ 24,3 milhões). Serão retirados também R$ 33,6 milhões destinados para a
construção de batalhões da PM e do Instituto Médico-Legal (IML) no Distrito
Federal. No Nordeste, a construção do sistema adutor do Rio Piancó pelo Departamento
Nacional de Obras Contra a Seca (Dnocs) teve R$ 10 milhões retirados. A obra
deve levar água da transposição do Rio São Francisco para 18 municípios
paraibanos.
O ensino superior também foi afetado. A Universidade
Federal do Acre (UFAC) teve R$ 6 milhões transferidos e a Universidade Federal
do Amapá (Unifap) ficou sem a emenda que previa R$ 27 milhões para a conclusão
das obras do Hospital Universitário. A expansão dos câmpus da Universidade
Federal do Espírito Santos (UFES) perdeu R$ 33 milhões.
Emendas
impositivas
De acordo com o governo, as emendas são impositivas, ou
seja, após aprovadas, têm de ser pagas. A definição sobre seu destino, no
entanto, cabe ao Congresso, e o governo não se pronuncia sobre o assunto. O
Orçamento dos ministérios não muda com o fundo. Em reportagem publicada ontem,
o Estado mostrou que, desde 2014, o valor liberado de emendas parlamentares foi
o maior em 2017.
Para chegar ao valor retirado da saúde e da educação, o
levantamento feito pelo jornal comparou a dotação das emendas originais apresentadas
pelos parlamentares com o que foi aprovado na Comissão Mista do Orçamento (CMO)
e no plenário do Congresso Nacional.
Cada uma das 27 bancadas apresentou duas emendas
impositivas, que somavam R$ 162,4 milhões. Como esse recurso não precisa obrigatoriamente
ser investido em uma área específica, houve uma redução proporcional de 30% no
valor para ser destinado ao fundo eleitoral, como determina a nova lei. Somente
a bancada paranaense apresentou suas emendas já prevendo uma parte dos recursos
para o fundo eleitoral.
Em novembro, reportagem do jornal antecipou que o impacto
mínimo só na área da saúde seria de R$ 70 milhões.
O montante final dependia da fase de discussões que os
parlamentares realizaram em dezembro na Comissão Mista do Orçamento. Como os
parlamentares não optaram por priorizar as áreas sociais, poupando-as do
remanejamento para custear as campanhas eleitorais, o valor total subiu.
O presidente da CMO, senador Dario Berger (MDB-SC), e o
relator da Lei Orçamentária Anual de 2018, deputado Cacá Leão (PP-BA), fizeram
um acordo para realizar um corte homogêneo sobre as duas emendas de cada
bancada, sem sacrificar apenas uma delas. As informações são do jornal O Estado
de S. Paulo.