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Por Luan Santos/ Correio 24h
Em menos de um ano desde a posse em janeiro
passado, o vereador Francisco de Assis Lima Damasceno (DEM), 48 anos, se tornou
o único integrante da bancada de oposição na Câmara de Santo Antônio de Jesus.
Ao longo de 2017, Chico de Dega, como é conhecido no município do Recôncavo
baiano, viu seus três ex-colegas de bancada migrarem para a base aliada do prefeito
Rogério Andrade (PSD). Agora, é a único dos 14 vereadores da cidade que se opõe
ao Executivo.
"Não é fácil ser a única voz de contestação.
Eu falo no plenário, questiono as propostas do Executivo, mas tem 13 depois
para me rebater. Tento fiscalizar, sozinho, obras, contas e equipamentos
públicos, mas não dá para ver tudo", resume Chico sobre a 'arte' de fazer
oposição sozinho. Além de Santo Antônio de Jesus, CORREIO encontrou outras duas
cidades em que vereadores, na prática, atuam solitários na ala contrária aos
governos municipais.
E há ainda os casos de Belo Campo, no Sudoeste baiano, e
Presidente Tancredo Neves, no Baixo Sul, onde praticamente todos os integrantes
da Câmara são ligados aos prefeitos José Henrique Tigre (PSD), conhecido como
Quinho, e Antonio dos Santos Mendes (PMDB), respectivamente.
A principal dificuldade na vereança solitária relatada por
eles é a falta de questionamento de projetos polêmicos vindos das prefeituras.
Eles acreditam que o desequilíbrio entre Legislativo e Executivo prejudica os
trabalhos nas câmaras e, consequentemente, o desenvolvimento de políticas
públicas nos respectivos municípios.
Recôncavo
Em Santo Antônio, Chico de Dega tem uma rotina intensa.
Como é solitário na oposição, costuma falar nos pequeno e grande expedientes,
usando o máximo de tempo que pode (cinco e dez minutos em cada, sendo que fala
pela oposição e pelo DEM). No entanto, tem a voz ofuscada pelos demais 13
integrantes do legislativo, que normalmente têm posicionamentos favoráveis ao
governo.
"Se tivesse oito de um lado e seis do outro, por
exemplo, o embate político seria melhor. Além disso, são muitas matérias para
fiscalizar, contas para analisar, obras, escolas e postos para visitar. Como
ele (o prefeito) tem maioria absoluta, manda os projetos em regime de urgência
para não passar pelas comissões, e isso é ruim, porque não temos debate. Esse
desequilíbrio é ruim para a cidade", reclama o vereador.
Apesar disso, o democrata tem ganhado visibilidade na
região, tanto que já sonha com uma candidatura a deputado federal. "Tem
essa vantagem. Como sou o único a falar pela oposição, acabo atraindo os
holofotes. Como Santo Antônio é uma cidade polo, consigo ter visibilidade em
toda a região", conta. "Há um interesse do partido e dos nossos
aliados na região, mas ainda não decidimos sobre a candidatura",
complementa.
Um dos exemplos citados por ele foi a votação do projeto da
nova base de cálculo do Imposto Predial Territorial Urbano (IPTU) do município.
"A prefeitura propôs um aumento absurdo, de mais de 50%, que acabou sendo
aprovado. Eu fui para as rádios, judicializei o caso, acabei chamando a atenção
da sociedade", contou. O líder do governo, Uberdan Cardoso (PT), por outro
lado negou o reajuste e disse que ninguém pagaria acima de 1,4% do valor em
2018.
O presidente da Câmara, Antonio Nogueira Neto (PSB), diz
que a relação é harmoniosa e independente, apesar da ampla maioria da base
governista. "Procuramos manter um diálogo franco e transparente, sempre. A
relação com o prefeito é a melhor possível, justamente porque há um diálogo
aberto entre prefeitura e câmara", pontua.
De acordo com ele, todos os projetos enviados à Câmara este
ano foram aprovados, mas não sem debate. "Nós damos nossa contribuição,
com emendas, com sugestões ao Executivo. Sempre somos atendidos. Atuamos também
na fiscalização das obras e contas e o prefeito sempre nos atende", diz
ele.
O prefeito Rogério Andrade concorda com o presidente da
Câmara e aliado. "A relação é harmoniosa e independente. Todos os nossos
projetos foram aprovados, sem exceção, com a participação ativa dos
vereadores", defende. Quando iniciou a gestão, Andrade tinha uma base com
dez aliados no Legislativo. Logo no início, ele conta, dois vereadores - Marcos
Có e Dr. Francisco, ambos do PPS - mostraram interesse em aderir ao seu
projeto.
"Nós conversamos e eles ficaram interessados e
migraram para nossa base. Depois, mais agora no segundo semestre, tivemos a
adesão de mais um. As portas estão abertas para quem quiser contribuir com a
gestão", diz. Chico de Dega revela que também foi convidado por aliados do
prefeito. "Fui chamado para conversar, mas não aceitei. O povo me colocou
na oposição. Não ia dar as costas ao povo para apoiar um projeto que não é meu
em troca de não sei quais interesses", diz, alfinetando os colegas que
migraram.
Andrade nega qualquer oferta de cargo. "Só nomeei 32%
dos meus cargos de confiança. Agora, eu chamo os vereadores para participar das
nossas obras, buscando prestigiá-los", conta.
Servidores
Em Tucano, no Nordeste baiano, o opositor solitário é
Florisval Araujo da Silva Neto (PT), popularmente conhecido como Neto do
Herlon. Aliás, ele diz que há mais três na bancada da qual é líder. Entretanto,
representantes da política local garantem que Neto é a voz solitária na Câmara,
e isso fica evidenciado nas votações, em que, na maioria das vezes, vota sozinho
contrário às propostas do governo.
A estratégia usada por ele para fazer barulho e atacar os
pontos fracos da gestão do prefeito Luiz Sérgio Soares de Souza Santos (PSD),
eleito com a alcunha de Dr. Sérgio, é buscar proximidade com os servidores públicos.
"Fazemos um trabalho junto ao Sindicato dos Servidores, buscando
fiscalizar obras e contas e acompanhando de perto a gestão", afirma. Mas
ele admite que o trabalho acaba sendo ofuscado pela maioria conquistada pelo
prefeito. "Óbvio que não é fácil, mas a gente tenta levar nossas pautas ao
máximo de pessoas que conseguimos, pelas redes sociais e pela mídia", diz.
Parceria
Dos 15 vereadores da Câmara de Itapetinga, apenas dois são
da oposição. Romildo Teixeira (PSL) e Valdeir Chagas (PDT) são os que mais
fazem críticas à gestão do prefeito Rodrigo Hagge (PMDB), o mais novo eleito na
Bahia em 2016 e neto de Michel Hagge, que também já comandou o município.
Contudo, na cidade, o que se diz é que apenas um deles (Romildo) faz uma
oposição mais dura, criticando projetos do Executivo e atuando na fiscalização
de irregularidades.
Para isso, a principal estratégia deles são as redes
sociais e os discursos no plenário durante as sessões, que costumam ser
transmitidos online. Com ampla base, o prefeito revela que conseguiu aprovar
todos os projetos que mandou para a Câmara. "Mas não é aprovar por
aprovar. Comigo não tem aquela de mandar projetos e aprovar por meio de
ferramentas políticas. Tenho a preocupação de levar os projetos com
antecedência e convocar o amplo debate com os vereadores", diz.
Hagge também diz ser transparente. "Temos um assessor
na prefeitura que cuida diretamente dessa relação com os vereadores. Além
disso, gosto quando eles vão in loco ver as obras e fiscalizar. É importante
para o trabalho", afirma.
O presidente da Câmara, Eliomar Barreira, correligionário
do prefeito, classifica a relação com a prefeitura como harmoniosa. Apesar da
aprovação máxima de todos os projetos do Executivo, ele diz que a Câmara
contribuiu com emendas. "No projeto que mexeu com a cobrança do ISS, foram
diversas emendas dos vereadores aprovadas na Câmara e com o aval do prefeito. É
uma parceria que tem dado certo, mas respeitando a independência", acredita
ele, conhecido como Tarugão.
Um caso curioso e oposto ao das cidades acima é o de
Jaguarari, onde o prefeito Everton Rocha (PSDB) só conta com um aliado na
Câmara. Recentemente, o Legislativo local aprovou, por 11 votos a um, a
abertura de Comissão Parlamentar Processante para investigar as denúncias de improbidade.
A manobra política, segundo informações de bastidores, tem sido conduzida pelo
presidente da Câmara, Márcio Gomes (PSDB).
Amizade
O prefeito de Belo Campo, José Henrique Tigre (PSD), tem
uma base aliada forte na Câmara Municipal. Todos os 11 integrantes do
Legislativo têm ligação com ele. Já na eleição, Quinho, como é conhecido,
contou com seis vereadores somente de seu partido.
No começo do mandato, chamou todos para conversar e os
convocou para um "pacto pela cidade", segundo afirma. "Não tenho
dificuldade nenhuma em dialogar com a Câmara, são todos meus amigos. Para além
do diálogo da política, há uma boa relação pessoal", revela.
"Acredito que é por isso que as coisas estão dando certo. Pagamos em dia
todas as nossas obrigações, desde fornecedores a salários dos servidores",
diz ele, que já foi vice-prefeito e secretário da Saúde do município.
Segundo ele, a "maioria esmagadora" dos projetos
que mandou para a Casa foram aprovador com os 11 votos favoráveis. "Um ou
outro teve discordância, o que é saudável até". Do mesmo partido do
prefeito, o presidente da Câmara, Marcio Robério Ferraz de Aguiar, diz que os
dois lados trabalham em prol do desenvolvimento da cidade. "O prefeito tem
feito um trabalho sério e manda para a Câmara projetos de interesse popular. Os
vereadores votam porque acreditam na forma de trabalho", diz.
Ele diz, contudo, que os legisladores atuam muito na
fiscalização. "Não somos subservientes. Estamos atentos e o prefeito
mantém as portas abertas e está sempre disposto a esclarecer as dúvidas",
afirma.
Em Presidente Tancredo Neves, no Baixo Sul, a situação é
parecida. Por lá, um ou outro vereador tem posicionamento contrário às pautas
do Executivo, mas na maioria das vezes a aprovação dos projetos é unânime. A
estratégia usada pelo prefeito Antonio dos Santos Mendes (PMDB) para atrair os
três integrantes da oposição para perto foi, segundo ele, a transparência.
"Convidamos todos para os eventos e para as reuniões.
Quando tem alguma obra, coloco o nome da Câmara também. Trabalhos de maneira
integrada. Inclusive, vou a Salvador resolver uma questão com a Embasa e já
chamei todos os 11 para ir comigo", contou. Ele não vê problema na falta
de oposição mais combativa. "É uma parceria em que todo mundo se beneficia
junto, especialmente o povo", diz.