Câncer é a principal causa de morte em quase 10% das cidades brasileiras

Claudio Reis/Eleven / Agência O Globo / Agência O Globo

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O câncer já é a principal causa de morte em quase 10% das cidades brasileiras — 516 do total de 5.570 municípios do país. Com isso, nesses municípios, os tumores malignos são mais fatais do que qualquer outro aspecto, seja em relação a doenças ou até mesmo acidentes de trânsito e homicídios. O levantamento, feito com base nos números oficiais mais recentes do Sistema de Informações de Mortalidade (SIM), de 2015, foi divulgado nesta segunda-feira pelo Observatório de Oncologia do movimento Todos Juntos Contra o Câncer, em parceria com o Conselho Federal de Medicina (CFM).

O Rio Grande do Sul é o estado com o maior número de municípios onde o câncer é a primeira causa de morte:140. Enquanto em todo o país as mortes por câncer representam 16,6% do total, no território gaúcho esse índice chega a 33,6%. De acordo com os autores da pesquisa, um dos fatores que pode explicar a alta incidência de câncer na região são as características genéticas da população, que, devido à cor de pele mais clara, pode apresentar maior predisposição para desenvolver o câncer de pele tipo melanoma, por exemplo.

No outro extremo, o Distrito Federal e o Amapá não contabilizaram nenhuma morte por câncer em 2015, ano-base para a pesquisa. Já no Estado do Rio, somente uma cidade aparece no levantamento: Cambuci, no Norte Fluminense. Nesta cidade, a taxa de morte por câncer registrada foi de 19 por cada 10 mil habitantes.

Os dados mostram que a maior parte das cidades onde o câncer é a principal causa de morte está localizada em regiões mais desenvolvidas do país, justamente onde a expectativa de vida e o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) são maiores. Dos 516 municípios onde os tumores matam mais, 80% ficam no Sul (275) e Sudeste (140). No Nordeste, estão 9% desses municípios (48); no Centro-Oeste, 7% (34); e no Norte, 4% (19). Ao todo, essas cidades concentram uma população total de 6,6 milhões de habitantes. Onze municípios são considerados de grande porte, sendo Caxias do Sul (RS) o mais populoso deles, com quase meio milhão de habitantes.

HOMENS SÃO OS QUE MAIS MORREM

O Observatório identificou que, das 9.865 mortes registradas nas 516 cidades, a maioria foi entre homens (57%). Seguindo a tendência do grupo, os homens lideram o número absoluto de mortes em 23 estados.

Em 21 cidades, não houve sequer registro de óbito entre as mulheres. Elas só foram maioria nos registros de mortes no Ceará e em Mato Grosso do Sul. Em 62 municípios, as mortes registradas em 2015 foram iguais para ambos os sexos.

Com relação à idade, metade das mortes se concentra nas faixas de 60 a 69 anos (25%) e 70 a 79 anos (25%). Em seguida, a maior proporção aparece no grupo dos que tinham mais de 80 anos (20%). Crianças e adolescentes, grupo que compreende a faixa etária de zero a 19 anos, somaram 1,3% dos óbitos.

ENVELHECIMENTO E MAIOR IDH INFLUENCIAM

Na avaliação da presidente da Associação Brasileira de Linfoma e Leucemia (Abrale), Merula Steagall, a mudança nos indicadores desses municípios reflete o novo perfil epidemiológico do Brasil, pois o câncer pode ser considerado uma doença vinculada ao desenvolvimento e à modernização em sociedade.

— Dentre as hipóteses que justificam esses números estão: o aumento da expectativa de vida e consequente mudanças genéticas decorrentes do envelhecimento da população; e o comportamento não saudável de milhões de brasileiros, que ainda são adeptos do consumo do tabaco, não realizam atividades físicas, sofrem com os efeitos da obesidade ou se expõem ao sol de forma excessiva e sem proteção — analisa a especialista.

Para ela, ao contrário de doenças infectocontagiosas, que sugerem a falência do sistema em seu nível básico, com dificuldade de fazer o rastreamento de casos e de ampliar a cobertura vacinal, o aumento do número de casos de câncer também pode sua explicação na melhoria do acesso á saúde:

— O métodos de diagnóstico estão mais sofisticados, e isso tem facilitado a descoberta precoce dos tumores — destaca Merula. Para Tiago Cepas Lobo, pesquisador do Observatório de Oncologia e um dos autores do estudo, o próximo passo é realizar mais estudos para entender melhor as causas do câncer nessas localidades e traçar estratégias em conjunto.

— Os lugares onde o câncer é a primeira causa de morte concentram 69% dos hospitais de referência, então, claro, existe nessas localidades um melhor diagnóstico. Em outras regiões, as pessoas morrem de câncer sem sequer saber que estão com câncer. Mas precisamos entender mais a fundo o que faz com que os óbitos se concentrem nas regiões de mais assistência — afirma Lobo. — A saida de longo prazo, tenho certeza, é a prevenção. Parece clichê, mas é o mais certeiro.

AUMENTO DE 90% NAS MORTES DESDE 1998

Atualmente, as complicações no aparelho circulatório, especialmente o Acidente Vascular Cerebral (AVC) e o infarto agudo do miocárdio, ainda são responsáveis pela maior parte das mortes. Em geral, são doenças associadas a má alimentação, consumo excessivo de álcool, tabagismo e sedentarismo. Contudo, os registros que ficam sob a supervisão do Ministério da Saúde mostram que a incidência de tumores malignos com desdobramentos fatais tem avançado.

No ano de 2015 (último período com estatísticas disponíveis), foram registradas 209 mil mortes por câncer e 349 mil relacionadas a doenças cardiovasculares e do aparelho circulatório. No entanto, quando comparados com os dados de 1998, por exemplo, percebe-se que o crescimento das mortes por câncer foi quase três vezes mais rápido do que daquelas provocadas por infartos ou derrames.

O número de mortes por câncer aumentou 90% em 2015 com relação a 1998, quando 110.799 pessoas foram à óbito por conta da doença. Nos mesmos períodos, houve uma alta de 36% entre as vítimas de doenças cardiovasculares, que na época somavam 256.511 pessoas. No mundo, o câncer é responsável por 8,2 milhões de mortes por ano em todo o mundo, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS). Aproximadamente 14 milhões de novos casos são registrados anualmente e o organismo internacional calcula que essas notificações devam subir até 70% nas próximas duas décadas.

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