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“Mbappé conseguiria fazer uns arrastões top na praia”.
“Sabe quem é, né? Sabe quem é? Isso é coisa de preto”. “Preta de merd@! Merece
a morte!”. Acredite ou não, todas essas frases foram ditas e ou escritas por
pessoas em pleno século XXI. Entre celebridades ou pessoas “comuns”, podemos
encontrar diversas expressões públicas de racismo, nas quais a cor da pele ou
traços de um outro indivíduo são motivos de chacota, inferioridade e injúria.
O racismo é tido como algo estrutural da sociedade em
geral. Isso porque há muito tempo atrás, na construção da história de diversas
civilizações, negros e negras eram tidos como animais não pensantes e sem alma,
nascidos apenas para servir e procriar. É a partir de pensamentos como estes
que toda a escravidão do povo afrodescendente se baseou por muitos anos.
Décadas passaram, o povo negro foi liberto e adquirindo um
pouco de espaço e direitos na sociedade. Entretanto, todo esse tempo corrido
não foi o suficiente para tirar toda essa estimação, preconceito e
inferioridade impostas a este povo. A escravidão se transformou em serviços
precários, desumanos e pouco remunerados, as senzalas cresceram para favelas,
comunidades e bairros periféricos. E todas as ofensas e humilhações se
mantiveram, as vezes de forma mais sutil e velada.
Indivíduos comuns em suas rotinas do trabalho, estudos e
lazer recebem cotidianamente olhares de julgamento, são abordados injustamente
e ouvem discursos de ódio. Recentemente, a cabeleireira Iaina
Fernanda Pereira, de 26 anos, foi agredida verbalmente e chamada de “macaca”
através de um aplicativo de celular. A jovem, apesar de muito assustada, não
escolheu ficar calada e foi atrás de seus direitos na Polícia e Ministério
Público.
O Varela Notícias procurou o advogado
criminalista Daniel Lima para tentar esclarecer como funciona todo o
procedimento jurídico caso alguém tenha sido vítima de racismo e/ou injúria
racial. Quem, como e onde recorrer, todas as dificuldades, facilidades e
burocracia.
(Foto: Divulgação) |
Racismo ou Injúria Racial?
Qualquer ação que seja considerada racista é tida como
crime imprescritível e inafiançável desde a Constituição 1988, de acordo com o
Artigo 5º, inciso 42 (Lei nº 7716.89). “O racismo atinge uma coletividade
indeterminada de indivíduos. Quando falamos sobre, não existe uma vítima
específica, mas sim pessoas negras que serão vítimas por conta da cor da pele.
Diferente do racismo, na injúria racial eu terei uma vítima determinada.
Atribuições de qualidades negativas à alguém, um insulto ou ofensa”, explica o
advogado criminalista, Daniel Lima.
“Entre as diferenças do racismo e injúria racial está
também o tamanho da pena. Enquanto no primeiro pode chegar a 5 anos, o segundo
não passa de 2 anos”. Desde 2015, o STJ decidiu que os casos de injúrias
raciais se assemelham aos do racismo, por isso também foram considerados
imprescritíveis. “Exemplos de casos de racismos são: negar emprego em
empresa privada por razão de cor, etnia; recusar acesso em estabelecimento
comercial; praticar, incitar ou induzir discriminação para raça, cor ou etnia”.
O que fazer em cada caso
Percebe-se que existem algumas disparidades e
peculiaridades entre os casos de racismo e injúria racial. Estas diferenças
também estão presentes na hora de recorrer à justiça. Daniel esclarece que a
posição da vítima nas duas situações funcionam de forma diferente:
“Diferentemente do racismo, a injúria racial necessita de
uma manifestação da vítima para que haja uma ação penal. Ou seja, se o ofendido
não for até a delegacia e ministério público para dizer que sofreu algum tipo
de agressão, não haverá ação. Já no caso do racismo, não precisa que ninguém
faça denúncia, uma vez que houve uma notícia, por meio de sites e outros, o
ministério público pode reunir provas para abrir a mesma”.
O procedimento de denúncia e busca por direitos nestes
casos irão permear duas instituições principais: o Ministério Público e a
Polícia.
“Se estiver ocorrendo no momento alguma agressão física ou
ofensa relativa à prática de injúria racial ou racismo, pode-se ser feita,
imediatamente, um ligação para a polícia através do 190. Se o caso já tiver
acontecido, o passo imediato é registrar um boletim de ocorrência na delegacia,
em ambos os casos”, explica Daniel.
O ideal para o registro do BO seria em uma delegacia
especializada, porém, no Brasil as únicas deste tipo estão localizadas em São
Paulo e Paraíba. Desta forma, a vítima deverá se encaminhar àquela mais próxima
de onde aconteceu o caso e assim notificar a ocorrência ao delegado ou
delegada.
(Foto: Divulgação) |
“Ainda na delegacia você deve
exigir que se abra um inquérito policial, porque não se trata de um crime de
menor potencial ofensivo, mas sim de crime onde a pena máxima ultrapassa dois anos.
Não pode ser por meio de termo circunstanciado, mas por instauração de
inquérito policial”, aponta o advogado.
Daniel ainda explica que ao
registar um BO é importante que a vítima indique ou apresente provas que possam
sustentar o que foi narrado no boletim. “É preciso exigir que a descriminação
seja colocada como a causa do crime, porque é isso que irá qualificar que a
injúria foi qualificada e o fato pode ter sido racismo”.
Caso prefira, o ofendido pode
levar o caso diretamente ao ministério público, que lá eles irão dar o
direcionamento para a delegacia competente. Todos estes procedimentos citados
acima são gratuitos, e a pessoa só irar gastar caso queira contratar um
advogado para acompanhar o caso.
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