Acostumado a rodar o Brasil
e levar multidões para suas missas, o padre
Robson de Oliveira Pereira, de 46 anos, é apontado como líder de uma organização criminosa que desviou
R$ 60 milhões doados pelos fiéis. Os recursos provenientes de doações foram
utilizados inclusive para a compra
de uma casa na Praia de Guarajuba, na Bahia, conforme aponta o Ministério Público de Goiás (MP).
O imóvel foi adquirido em
2014 por R$ 2 milhões e o valor foi pago à vista. A aquisição foi feita pela
Associação Filhos do Pai Eterno (Afipe), criada e presidida pelo padre Robson.
A compra foi efetuada de uma empresa chamada Sistema Alpha de Comunicação, que
também é investigada.
“As contas bancárias da Afipe
foram usadas para comprar fazendas, residências em condomínio fechado,
apartamentos em São Paulo e Goiânia, fazendas em todo o Brasil, mineração. Quer
dizer, a Afipe é hoje uma grande empresa. Ela tem o argumento religioso mas se
converteu em uma grande empresa no Estado de Goiás que explora inúmeras
atividades, agropecuaria e mineração, compra inúmeros imoveis e vende inúmeros
imóveis”, disse o promotor Sebastião Marcos Martins, coordenador da
investigação.
Além da casa de praia, uma
chácara com casa de paredes de vidro com vistas para o jardim, uma piscina
aquecida e um ofurô também teria sido comprada com dinheiro doado por fiéis
para a Afipe. A propriedade foi alvo de busca e apreensão realizada na manhã
desta sexta-feira (21). O MP chegou a pedir a prisão preventiva do padre, mas o
pedido foi negado pela juíza Placidina Pires, da Vara de Feitos Relativos a
Organizações Criminosas e Lavagem de Capitais.
Nos últimos três anos, a Afipe
movimentou R$ 120 milhões. Desse montante, o Judiciário sustenta que até o
momento pode-se afirmar que R$ 60 milhões foram desviados dos cofres da Afipe.
A entidade foi criada para manter as atividades da Basílica do Divino Pai
Eterno, em Trindade, município localizado a 23 km de Goiânia. As informações
constam na decisão que autorizou a realização de busca e apreensão em endereços
ligados ao padre nesta sexta-feira (21).
As investigações começaram depois
que o padre Robson foi vítima de extorção, em 2017, quando ele teve computador
e celular hackeados e passou sofrer chantagem “para que não divulgassem imagens
e mensagens eletrônicas com informações pessoais, amorosas e profissionais que
levassem a prejudicar sua imagem”, segundo o MP.
Na ocasião, o padre transferiu
mais de R$ 2 milhões das contas bancárias da Afipe para os criminosos. A
quadrilha foi condenada em 2019, mas o uso do dinheiro da fundação para fins
pessoais ligou o sinal de alerta das autoridades. O MP afirma que Robson
apropriou-se de valores arrecadados dos fiéis e utilizou para finalidades
diversas daquelas desenvolvidas pela entidade.
“Os elementos informativos
coletados indicam que as doações feitas por fiéis de todo o país para o custeio
das atividades da Afipe e para o pagamento das obras e projetos de cunho social
da mencionada associação, na verdade, estariam sendo utilizadas para
finalidades espúrias”, escreve a juíza Placidina Pires na decisão.
Entre essas
finalidades, prossegue o texto, estão o pagamento de despesas pessoais dos
investigados e a aquisição de imóveis, incluindo várias fazendas e casa de
praia, que, a princípio, não se destinam ao atendimento dos seus propósitos
religiosos.
Batizada de
“Vendilhões”, a operação investiga crimes de apropriação indébita, lavagem de
dinheiro, falsificação de documentos, sonegação fiscal e associação criminosa.
Ao todo, foram cumpridos 16 mandados de busca e apreensão em locais como
chácaras, casas e a sede da Afipe. A juíza Placidina Pires também determinou o
bloqueio de valores da Afipe até o limite de R$ 60 milhões, por meio do
sequestro de bens imóveis ou o bloqueio de valores em conta.
DOAÇÕES DE FIÉIS
Nascido e criado em
Trindade, padre Robson morou na Irlanda e fez mestrado em Teologia Moral na
Universidade do Vaticano, em Roma. Ele retornou ao Brasil no ano de 2003,
quando assumiu a reitoria do Santuário do Divino Pai Eterno. Uma de suas
primeiras ações como reitor foi pedir ao Vaticano o título de Basílica.
O reconhecimento
veio em 2006, pelo Papa Bento XVI, que concedeu o título de Basílica Menor,
tornando-a a única no mundo dedicada ao Divino Pai Eterno. A atual Basílica
conta com cerca de 2,5 mil lugares. Mas uma outra está em construção e terá
capacidade para 6 mil pessoas. A obra é desenvolvida com dinheiro de doações
feitas pelos fiéis.
Com missas realizadas no
local transmitidas ao vivo pela Rede Vida, o trabalho do padre Robson passou a
repercutir no Brasil e no exterior. O pároco chegou a celebrar missa em eventos
como a Festa do Peão de Boiadeiro de Barretos e realizou a Novena dos Filhos do
Pai Eterno em países como Israel, Portugal, Espanha, Itália, México e França.
O advogado Klaus Marques,
que representa a Afipe, afirmou que todos os negócios da entidade estão
contabilizados. Ele justificou a compra de fazendas, apartamentos e postos de
combustíveis como uma forma de investimento e justificou que os rendimentos são
integralmente aplicados na entidade.
“A Afipe tem diversas atividades fim, uma delas é a
evangelização pelos meios de comunicação. Vocês devem conhecer a rádio Pai
Eterno, mais recentemente a TV, um enorme conglomerado comunicacional que custa
dinheiro. Para que a Afipe pudesse ter tudo isso ela precisou de recursos. A questão
toda era: vou manter todos os recursos que eu recebo dos meus fiéis no banco,
com taxa selic de 2% ao ano ou vou fazer aplicações em outros mercados e ter
rendimentos maiores?”, disse o advogado.
Época