A pandemia de coronavírus e a alta no preços de alimentos têm provocado mudanças nas refeições dos brasileiros. Depois de cortar a carne e substituir até o frango pelo ovo, a vendedora Liliane Siqueira, 45, cogita agora mais uma alteração no cardápio da família: incluir salsicha nas refeições. Como a carne vermelha já está ''nas alturas", agora até as proteínas que eram opções mais em conta em 2020, como o ovo, a carne de porco e o frango, podem ficar mais caras. A projeção dos produtores é que esses alimentos subam até 50% nos próximos meses.
Segundo a Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA), a nova alta será consequência da elevação dos preços do farelo de soja e milho, principais componentes da nutrição dos animais. Em Minas Gerais, no último ano, o preço do milho pago ao produtor subiu 108% e da soja 50%, segundo Federação da Agricultura e Pecuária do Estado de Minas Gerais (Faemg).
O resultado de todas essas altas, de acordo com o presidente da ABPA, Ricardo Santin, foi o aumento no Índice de Custo de Produção de junho, que teve acréscimo de 52,3% para frangos e 47,53% para suínos. Como consequência, no acumulado do últimos 12 meses, segundo o IBGE, as carnes de porco já dispararam mais de 32%, enquanto o frango e ovos, subiram 19,77% e 16,41%, respectivamente.
Como a carne bovina subiu até 46,06% em um ano, dependendo do corte, a migração do consumidor para frango e porco também pressionou seus preços.
“Uma parte desses custos já foi repassada, os produtores estão trabalhando no prejuízo desde setembro do ano passado. À medida que os estoques do milho e farelo de soja, comprados por um preço menor ano passado, acabarem, os criadores de frangos e suínos, granjas e empresas, terão de adquirir os grãos no preço atual, bem mais caro, e aí terão que fazer o repasse dos custos”, explica Santin. “Não queremos diminuir o prejuízo diminuindo produção, porque nesse cenário o consumidor além de pagar caro não vai encontrar o produto. Não tá faltando alimento apesar da exportação e do aumento da demanda. Nós não somos a causa do aumento”, completa o presidente da entidade.
Para o analista de agronegócios da Gerência Técnica do Sistema Faemg, Wallisson Lara, mais cedo ou mais tarde, os produtores iriam repassar os custos para o consumidor. “Temos visto os commodities do agro no geral puxado pelo efeito China. Temos a soja e o milho exportando mais. Com isso, o preço dos insumos estão inviabilizando o pecuarista, eles estão trabalhando no vermelho”, avalia o especialista, que cita também a alta demanda do mercado externo.
Com o aumento dos preços, o Brasil registra, atualmente, o menor nível de consumo de carne bovina em 25 anos de acordo com a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab). “Não sei o que me resta mais, só se comer salsicha, linguiça e pão com presunto”, desabafa Liliane.
Outro lado
A Associação de Frigoríficos de Minas Gerais, Espírito Santo e do Distrito Federal (Afrig) disse que não há possibilidade de aumento dos frangos e da carne de porco. “A China tem comprando mais devagar, então, a tendência é que sobre mais pro mercado externo”, destaca o presidente da entidade, Silvio Silveira.
Especialista aponta alta generalizada de produtos
Com a redução da renda, famílias de classes mais vulneráveis têm substituído as refeições por mingau durante a pandemia. De acordo com um estudo da Kantar, empresa especialista em dados e consultoria, o impacto da inflação no país aumentou também o consumo do hambúrguer, da linguiças, do pão industrial e da maionese.
Para quem está planejando substituições nas refeições devido a alta dos preços, o diretor do site Mercado Mineiro, Feliciano Abreu, alerta: “É difícil saber por que substituir. A salsicha, por exemplo, subiu 6% em dois meses em BH devido ao aumento da demanda. Então, nem tem sido uma solução, além de que é preciso cuidado ao olhar o preço, porque tem a questão da qualidade do produto até quando falamos na linguiça”, afirma o economista que já adianta que os preços tendem a continuar altos. “O aumento do preço é resultado da a exportação, do dólar, da desvalorização do real, com isso, o mercado interno acaba não compensando. Os preços não vão diminuir, é preciso aumentar poder do real”, destaca.
O Tempo