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A Agência Nacional de
Energia Elétrica (Aneel)
anunciou na terça-feira (31) a criação
de uma nova bandeira tarifária, a Bandeira Escassez Hídrica. Ela reflete
os aumentos de custos de geração de energia em meio à pior crise hídrica em 91 anos e devem
impactar a conta de luz.
Mas o que são essas
bandeiras tarifárias? Como ficam as tarifas? Por que a conta de luz está
subindo tanto? Como funciona o bônus anunciado pelo governo? Tire essas e
outras dúvidas a seguir:
O
que é o sistema de bandeiras tarifárias?
O sistema de bandeiras
tarifárias foi criado em 2015, outra época de alta nas contas de luz. A ideia era tornar as
variações nas contas de luz mais transparentes para o consumidor. Antes do seu
estabelecimento, eventuais custos maiores de geração de energia eram repassados
para os consumidores apenas no ano seguinte. Com a mudança, as variações nesses
custos são refletidas nas contas mês a mês.
O sistema envolvia, até esta
semana, quatro bandeiras: a verde, a amarela, a vermelha patamar 1 e a vermelha
patamar 2. Agora, soma-se a elas a Bandeira Escassez Hídrica.
O
que cada bandeira significa para a conta de luz?
Segundo a Aneel, o sistema
de cores das bandeiras foi inspirado nas cores de um semáforo. A ideia é
incentivar o consumidor a desacelerar o consumo, de forma mais devagar na
amarela e mais rápida na vermelha, para reduzir a demanda de energia e, com
isso, os custos na geração.
A
bandeira verde aparece na conta de luz quando não há
condições desfavoráveis para a geração de energia. Com isso, não há nenhum
acréscimo para o consumidor na tarifa.
Já
a bandeira amarela sinaliza que algumas condições que encarecem
a geração de energia começaram a aparecer. Com isso, a tarifa passa a ter um
acréscimo de R$ 1,874 para cada 100 quilowatt-hora (kWh) que for consumido no
mês.
A bandeira vermelha sinaliza
uma piora nas condições de geração de energia. O patamar 1 da bandeira
representa um acréscimo de R$ 3,971 para cada 100 quilowatt-hora (kWh)
consumido. Já o patamar 2 representa um acréscimo de R$ 9,492 para cada 100
quilowatt-hora. Quanto maior o patamar, maiores os custos de geração.
Agora, a Bandeira Escassez
Hídrica representará uma cobrança de R$ 14,20 a mais para cada 100 quilowatt-hora
consumidos. Se antes, com a bandeira vermelha patamar 2, a mais cara até então,
o consumidor pagaria R$ 69,49 por 100kWh consumidos, por exemplo, agora ele
pagará R$ 74,20 kWh, uma alta de 6,78%.
André Braz, economista do
Instituto Brasileiro de Economia da FGV, observa que o valor da bandeira
vermelha tarifária 2 já havia
subido em junho de 2021. Antes, ela era de R$ 6,24 para cada 100
kWh consumidos. Somando o reajuste da bandeira vermelha e a criação da Bandeira
Escassez Hídrica, ele aponta alta de 127% nessa tarifa entre julho e setembro
deste ano.
Ele diz que ter uma nova
bandeira faz sentido, já que ela evita a criação de uma distorção muito grande
no valor da bandeira vermelha patamar 2 em relação às anteriores. Segundo ele,
se o valor da nova bandeira fosse colocado na vermelha patamar 2 “não seria
possível utilizá-la no futuro, a menos que ela fosse reduzida”.
Quem
escolhe qual bandeira será usada na conta de luz?
A bandeira que aparecerá na
conta de luz do consumidor é definida mensalmente pela Aneel, a agência do
governo responsável por regularizar e fiscalizar a geração, transmissão,
distribuição e comercialização da energia elétrica no Brasil.
As reuniões ocorrem no fim
de cada mês, para definir a tarifa que aparecerá na conta de luz no mês
seguinte.
Apesar de a criação da
Bandeira Escassez Hídrica ter sido feita pela Aneel, a agência seguiu uma
determinação da Câmara de Regras Excepcionais para Gestão Hidroenergética
(CREG). O órgão foi criado pelo
governo em 2021 para coordenar o enfrentamento à crise hídrica.
Quando
a Bandeira Escassez Hídrica entrará em vigor?
A Aneel informou que a
Bandeira Escassez Hídrica entrará em vigor já em setembro, e deverá permanecer
nas contas de luz até pelo menos abril de 2022.
Braz afirma que “as chances
de revisão [da nova bandeira] são pequenas” porque os números dos reservatórios
estão muito baixos, e devem continuar assim. “Especialistas já antecipam que
mesmo com mais chuva, não vai ser suficiente para recuperar os números.”
Os consumidores de Roraima e de algumas regiões
remotas do país não pagarão a taxa, pois não fazem parte do chamado Sistema
Interligado Nacional, que distribuiu a energia gerada para todo o país. Além
deles, os beneficiários da tarifa social também não terão o valor adicional da
nova bandeira, pagando o valor da bandeira vermelha patamar 2 com desconto.
Quais
fatores estão fazendo a conta de luz subir?
O principal responsável
pelas altas recentes na conta de luz, e pela necessidade de criação da nova
bandeira, é a crise hídrica que começou neste ano. O termo significa que
os índices de chuva estão bem abaixo do desejado.
O Brasil gera boa parte da
sua energia elétrica a partir das chamadas usinas hidrelétricas. Nelas, a água
armazenada em reservatórios gira turbinas que, então, geram a energia. Com
menos chuvas, os reservatórios dessas usinas vão perdendo volume e, com isso,
geram menos energia.
Para manter o nível de
geração de energia, evitando apagões, por exemplo, o governo precisa recorrer a
outras fontes de geração. A mais comum é a usina termelétrica, em que a energia é gerada a partir da queima
de algo, geralmente carvão ou óleo diesel. O problema é que os custos de
operação dessas usinas são maiores, e eles são repassados para os consumidores
na conta de luz a partir do sistema de bandeiras.
“Em um momento como agora,
com pouca chuva no inverno e níveis de reservatórios comparados aos de 2001 e
2002, é necessário usar as termelétricas”, explica Braz. Ele destaca que as
termelétricas brasileiras queimam, principalmente, óleo diesel, que também
ficou mais caro em meio à alta do petróleo.
Como o sistema de
distribuição de energia é interligado, as altas nas contas de luz acabam sendo
repassadas para todos os consumidores, não apenas para aqueles que vivem nas
áreas em que a produção de usinas hidrelétricas caiu, por exemplo.
Quais
os efeitos da nova bandeira para a economia?
A nova bandeira anunciada
pela Aneel possui um efeito direto para os consumidores: quanto maior a conta
de energia em uma residência, maior o impacto dessa cobrança extra. Essa alta
deve refletir nos índices inflacionários, incluindo o Índice de Preços ao
Consumidor Amplo (IPCA), considerado a inflação oficial do Brasil.
Além disso, há outro efeito
indireto dessa alta. “A energia mais cara encarece produtos e serviços que
mesmo que a bandeira sai de circulação, não necessariamente esses preços irão
recuar”, diz Braz.
“Quanto maior o número de
meses que for mantido ativo, mas ele compromete a inflação”, afirma o economista. Segundo ele, a expectativa do
mercado parecia ser de uma cobrança adicional maior que a anunciada com a nova
bandeira, mas o valor superou o projetado por Braz. Com isso, o economista
também elevou sua projeção para a inflação em 2021, que segundo ele pode passar
de 8%.
O
que é o programa de redução voluntária do consumo de energia?
Com a nova bandeira, o
governo também anunciou a criação de um programa de redução voluntária de
consumo de energia, que envolve um bônus para quem cortar o consumo entre
setembro e dezembro.
A redução mínima no consumo
para ingressar no programa é de 10%, e o pagamento é limitado até 20%. Ou seja,
mesmo se reduzir mais do que 20%, receberá o bônus equivalente apenas a essa
porcentagem.
O prêmio para os consumidores
será de R$ 50 a cada 100 kW reduzidos no consumo e vai comparar a média de
consumo deste ano com o ano passado. O Ministério de Minas e Energia dá o
seguinte exemplo:
- Se uma família consumiu 120 kWh em
setembro de 2020, 130 kWh em outubro, 110 kWh em novembro e 140 kWh em
dezembro de 2020, a sua média será de 125 kWh
- Caso os próximos consumos dessa família
sejam 105 kWh em setembro, 110 kWh em outubro, 100 kWh em novembro e 110
kWh em dezembro de 2021, seu consumo médio durante a apuração do programa
terá sido de 106,25 kWh
- Essa família terá reduzido 15% o seu
consumo em relação à média dos mesmos meses do ano passado
- Ao final do programa, a família terá
direito de receber R$ 37,50 a título de bônus.
Segundo o governo, a
previsão é que cerca de 20% dos consumidores entrem no programa, o que seria
equivalente a R$ 340 milhões por mês, ou 914 MW (mega-watts) de consumo.
Fonte: CNN