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O mundo começou a quinta-feira (24) em alerta vermelho
com a notícia da invasão russa à Ucrânia. Os países entraram em choque nas
primeiras horas da madrugada (horário de Brasília), após semanas de tensão.
A escalada da aversão ao risco foi a reação imediata dos
investidores, fazendo com que as principais bolsas de valores aprofundassem
suas perdas, com destaque para a bolsa de Frankfurt, que chegou a cair 5%. Isso
sem contar no índice de Moscou, principal da bolsa russa, que chegou a cair 45%
mais cedo.
No Brasil, onde bolsa e câmbio vinham se beneficiando do
fluxo estrangeiro atraído pelas commodities e ativos considerados baratos, não
foi diferente. No fim da manhã, o dólar avançava 1,83% em relação ao real,
cotado a R$ 5,096. No mesmo horário, o Ibovespa caía 2,02%, aos 109.742 pontos.
Para além do impacto no mercado financeiro, um ponto de
alerta para o Brasil, agora que o conflito no leste europeu se concretizou, é
inflação.
O cenário de preços mais altos e atividade estagnada é
prejudicial para a economia de uma forma geral, desde consumidores até
integrantes das cadeias produtivas no país.
Um
alerta para os preços
“O principal desdobramento para o Brasil pode vir por
meio das commodities”, diz Étore Sanchez, economista-chefe da Ativa
Investimentos. ” No rali histórico dos preços, isso acarreta uma inflação
maior, num ambiente em que já estamos com a corda puxada”, diz.
O preço do barril de petróleo ultrapassou US$ 100 mais
cedo, o que pressiona a Petrobras a reajustar os combustíveis “muito em breve”,
segundo Sanchez. O item foi um dos
maiores responsáveis pela inflação acima do teto da meta no ano passado, algo
que não acontecia desde a última recessão pela qual o país passou.
“As pressões sobre os [preços dos] combustíveis afetam o
mundo inteiro. Piora ainda mais uma inflação que já está muito elevada”, diz o
economista-chefe da MB Associados, Sérgio Vale. “Se tem mais inflação, será
necessário subir mais os juros, e juros mais altos dificultam o crescimento lá
na frente.”
E a pressão pode vir de todos os lados, já que Rússia e
Ucrânia são grandes exportadores de commodities agrícolas, como trigo e milho,
e energéticas, como petróleo.
“Esse evento traz uma pressão adicional sobre as
commodities e sobre o quadro inflacionário, que já vinha sendo observado pelos
investidores. A grande dúvida agora é como os bancos centrais vão agir com os
resultados do que vem acontecendo”, diz Jennie Li, estrategista de ações da XP.
Os últimos acontecimentos já colocam dúvidas, por
exemplo, no tamanho da alta que o Federal Reserve (BC dos EUA) pode anunciar em
março, quando o mercado espera um anúncio de aperto monetário.
“A guerra efetiva deve ter impactos significativos sobre
a inflação global, que já está elevada, o que colocará o Fed numa
encruzilhada”, diz o economista-chefe da Órama, Alexandre Espirito Santo. Isso
pode significar, segundo o economista, um anúncio de alta de 0,25 ponto na taxa
de juros em vez dos 0,5 ponto esperado anteriormente.
Ruim,
mas nem tanto
Apesar dos riscos que o conflito na Ucrânia representam
para o Brasil, especialistas ponderam que o cenário pode ser menos preocupante
do que em outros países.
“Isso por conta da alta de commodities e pelo fluxo de
investidores globais saindo da Rússia e da Ásia e procurando outros mercados
emergentes”, explicou. “O mercado brasileiro pode seguir tendo uma performance
boa, não necessariamente subindo, mas caindo menos do que outros mercados”,
disse Jenni Li.
João Beck, economista e sócio da BRA Investimentos,
também disse acreditar que o país pode continuar atraindo capital estrangeiro.
“A narrativa da busca por ativos de ‘valor’, a despeito
da fuga de tecnologia e empresas ainda sem lucro, também contribuiu que o
Brasil recebesse um fluxo muito positivo nos últimos meses”, diz.
Beck se refere à fuga de investidores de empresas que tem
previsão de lucro para um futuro mais distante — muito prejudicadas recentemente
pela expectativa de alta nos juros americanos. Esse movimento acabou
beneficiando o Brasil, onde as principais empresas que compõe o Ibovespa não
têm essa característica.
O economista, no entanto, alertou que as oportunidades
também podem ser enxergadas como altos riscos de investimento, diante de tantas
incertezas que ocorrem no Brasil.
“Nunca podemos deixar de enxergar Brasil como país
emergente e suscetível à aversão a risco global. E, portanto, sujeito aos
mesmos efeitos deletérios do que ocorre nas potências globais. Em especial o
contágio de inflação, que pode forçar o Banco Central americano ao aumento mais
acentuado da taxa de juros num ambiente econômico fragilizado e endividado”,
afirmou.
Por Juliana Elias / CNN Brasil Business