As contas anuais de 2017 da Prefeitura Municipal de
Salvador e de responsabilidade do ex-prefeito ACM Neto se encontram na Comissão
de Finanças, Orçamento e Fiscalização da Câmara Municipal da capital. Elas
foram inicialmente aprovadas com ressalvas pelo Tribunal de Contas dos
Municípios – TCM, em dezembro de 2018, que emitiu o Parecer Prévio nº 03498e18.
Em virtude da regra prevista no artigo 31 da Constituição
Federal, a competência para decisão final acerca da rejeição ou aprovação de
contas anuais é da Câmara de Vereadores, cabendo ao TCM, como fez no caso,
apenas emitir parecer prévio que poderá ser mantido ou revisto por um decreto
legislativo (espécie de ato normativo) emanado da Câmara.
Opinativo jurídico
Por detectar incongruências nas informações prestadas nas
contas de 2017 e 2018, a vereadora Marta Rodrigues (PT), presidente da Comissão
de Finanças, Orçamento e Fiscalização, solicitou, com o apoio da Controladoria
Geral da CMS, que a Procuradoria Jurídica da Casa analisasse os fatos e
emitisse um parecer a fim de subsidiar o relatório e voto que nascerão na
própria Comissão e seguirão para deliberação plenária.
Se os vereadores seguirem o opinativo do setor jurídico,
ACM Neto fica inelegível, esbarra na lei da ficha limpa e sai do jogo eleitoral
de outubro, devendo indicar um substituto para a disputa. Por outro lado, se os
vereadores optarem por acatar o parecer prévio do TCM, que em alguns casos
deixa de ir a detalhes quase que imperceptíveis, mas de suma importância no
contexto das contas, o ex-prefeito não se enquadrará no artigo 1º, inciso I,
alínea “g”, da Lei das Inelegibilidades, garantindo a manutenção de seu nome
nas urnas.
Opinativo técnico da CMS aponta ato de improbidade
Dentre os argumentos do parecer emitido pelo Procurador
Chefe e pelo Subprocurador Chefe, ambos da Câmara Municipal de Salvador, quatro
pontos são graves e autorizam a rejeição das contas. Na análise, os
procuradores também demonstram que, em casos idênticos ao da capital, o próprio
TCM teria rejeitado contas de outras prefeituras, o que não teria ocorrido em
Salvador, pois “o Gestor utilizou-se de informação inverídica nas contas de
2017 e somente buscou sua correção quando da apresentação das contas de 2018,
reconhecendo e atestando um gasto com publicidade muito acima do quanto
efetivamente praticado”.
O opinativo dos procuradores, para recomendar a rejeição
das contas de 2017, de responsabilidade de ACM Neto, se baseia, ainda, nas
premissas de reincidência na ausência de planejamento por parte da
Administração Pública ao elaborar as suas peças orçamentárias, recomendado nas
contas de 2016 e 2015; reincidência na baixa arrecadação de dívida ativa,
alertada e recomendada nos Pareceres Prévios das contas de 2013, 2014, 2015 e
2016; e reincidência no alto gasto com despesas de publicidade, recomendado nas
contas de 2014, 2015 e 2016.
Gastos com publicidade teriam sido maquiados
O ponto mais emblemático do parecer emitido pelo Procurador
Chefe e pelo Subprocurador Chefe da Câmara Municipal de Salvador é gravíssimo e
pode configurar ilícito civil e penal. Sobre esses gastos, a anotação do
parecer é esclarecedora e diz o seguinte:
“O ponto mais sensível da análise deste parecer refere-se
as despesas com publicidade, descrita no item 14 do parecer prévio exarado pelo
TCM-BA. Sabe-se que o princípio da publicidade é um dos pilares da
administração pública, entretanto, referida despesa deve ocorrer com moderação
e estar de acordo com o § 1º do art. 37 da Constituição Federal.
A deliberação do TCM-BA consignou que o Município de
Salvador, no exercício financeiro de 2017, realizou um percentual de 0,32% da
receita com gastos de publicidade.
(...)
Percebe-se que a Corte de Contas levou em consideração dois
fatores para atestar a regularidade dos gastos:
1 – que houve um decréscimo nas despesas com publicidade,
em comparação com os exercícios de 2014, 2015 e 2016;
2 – que o percentual de despesa com publicidade alcançou
seu menor percentual nos últimos 6 (seis) anos analisados;
Entretanto, para surpresa deste corpo jurídico, o Gestor
informou nas contas do exercício de 2018 (Processo TCM nº 04523e19), que em
verdade, os gastos com publicidade relativos ao ano de 2017 foram na monta de
R$ 57.710.646,14 (cinquenta e sete milhões, setecentos e
dez mil, seiscentos e quarenta e seis reais, e quatorze centavos) e não de
R$ 17.565.073,67 (dezessete milhões, quinhentos e sessenta
e cinco mil, setenta e três reais, e sessenta e sete centavos) como havia sido
consignado anteriormente, importando no percentual de 1,04% da sua arrecadação.
Ora, o Gestor utilizou-se de informação inverídica nas
contas de 2017 e somente buscou sua correção quando da apresentação das contas
de 2018, reconhecendo e atestando um gasto com publicidade muito acima do quanto
efetivamente praticado.
Por qual motivo referida distorção apenas foi apontada nas
contas do exercício de 2018 e não no mesmo exercício de 2017?
Percebe-se que o Administrador Público se valeu de dados, a
princípio, inverídicos, para se valer de uma redução imaginária de gastos com
publicidade, que, em verdade, não são fidedignos à própria realidade, somente
vindo a ser revelados no ano de 2018, com o propósito de driblar a correta
análise do TCM quanto às contas de 2017.
A fictícia redução dos gastos com publicidade, achada de
forma ludibriada pelo TCM no exercício de 2017, repercutiu positivamente no
julgamento das contas, todavia, de acordo com as informações prestadas no
exercício de 2018 (que necessariamente dizem respeito ao exercício de 2017), a
realidade se mostra diversa, revelando uma gravíssima conduta dolosa do então
prefeito Antônio Carlos Peixoto de Magalhães Neto.
Em verdade, de acordo com as próprias informações
fornecidas pelo Gestor no âmbito do TCM-BA (Processo nº 04523e19), os gastos
com publicidade no ano de 2017 foram superiores ao ano de 2016, mesmo já tendo
o gestor sido alertado anteriormente na exorbitância de tais despesas e a
necessidade de agir com mais prudência em relação a estas.”
Maquiagem
Da análise do documento ao qual A TARDE teve acesso com
exclusividade, evidenciou-se que a gestão de ACM Neto, durante o exercício
orçamentário de 2017, promoveu uma maquiagem no tocante ao tema das despesas
com publicidade, informando que os gastos teriam sido de R$ 17.565.073,67
(dezessete milhões, quinhentos e sessenta e cinco mil, setenta e três reais, e
sessenta e sete centavos), quando, na verdade, foram de
R$ 57.710.646,14 (cinquenta e sete milhões, setecentos e
dez mil, seiscentos e quarenta e seis reais, e quatorze centavos).
Essa “fictícia redução dos gastos com publicidade”, nas
palavras dos procuradores, teve o nítido propósito de burlar o Tribunal de
Contas dos Municípios e impedir que esse Órgão rejeitasse as contas de 2017.
Não foi por outra razão que o parecer a ser analisado pela
vereadora Marta Rodrigues, presidente da Comissão de Finanças, Orçamento e
Fiscalização e pelo seus demais pares, foi contundente ao asseverar que “o que
está a se discutir aqui, além da própria divergência de dados que podem
implicar no julgamento de mérito das contas, é a utilização de informações
inverídicas no julgamento prévio das contas do exercício de 2017 pelo TCM, fato
que pode gerar consequências não só na esfera administrativa, como na área
cível e penal” e que “além disso, o elevado valor com gastos de publicidade foi
expressamente alertado ao Gestor em contas de exercícios anteriores,
demonstrando a notória reincidência e o descumprimento das recomendações da
corte de contas”.
Em mais um trecho do parecer, anota-se que “em 4 (quatro)
anos consecutivos o gestor foi advertido pela Corte de Contas relativamente ao
elevado valor com gastos de publicidade, entretanto, não promoveu medidas
adequadas a reduzir tal montante, ao revés, no ano de 2017 o montante com
publicidade foi maior, tanto em valor absoluto quanto em percentual de receita
em relação ao ano de 2016, fato que necessariamente deve ser levado em
consideração na análise desta Casa”, ressaltando também que “chama a atenção
que o Ministério Público de Contas junto ao TCM-BA vem, em todos os seus
pronunciamentos, solicitando a realização de auditoria nos contratos de
publicidade, para verificar se estes estão dentro da legalidade e se atendem as
determinações do art. 37 da Constituição Federal, não tendo, curiosamente, sido
o opinativo ministerial observado pela Corte de Contas”.
Para concluir o tópico da maquiagem com os gastos de
publicidade, o opinativo deduz que “diante de tais fatos, gravíssimos,
registre-se, não se pode encarar a conduta do Gestor como regular, sobretudo
diante das inverídicas informações apresentadas junto à prestação de contas do
exercício de 2017 perante o TCM-BA, bem como pela reiterada conduta em gastar
excessivamente o erário público com despesas de publicidade, descumprindo as
recomendações da Corte de Contas feitas em anos anteriores”.
Baixa arrecadação de dívida ativa é conduta reiterada desde
2013
Logo no primeiro ano
da gestão, ACM Neto foi advertido pelo Tribunal de Contas dos Municípios sobre
a baixíssima arrecadação da dívida ativa consolidada e isso ficou evidente em
trechos do próprio Parecer Prévio nº 03498e18, emitido pelo TCM, que analisou
as contas de 2017. Sobre esse tema, a narrativa fática do TCM foi a seguinte:
“A arrecadação da Dívida Ativa, em 2017, após esclarecimentos
da Prefeitura, alcançou R$ 123.066.023,19 (cento e vinte e três milhões,
sessenta e seis mil, vinte e três reais e dezenove centavos). Sendo R$
116.059.799,78 (cento e dezesseis milhões, cinquenta e nove mil, setecentos e
noventa e nove reais, e setenta e oito centavos) oriundos de receita da dívida
ativa tributária e
R$ 7.006.223,41 (sete milhões, seis mil, duzentos e vinte e
três reais e quarenta e um centavos) da não tributária. Esse montante
equivalente a 0,62% do saldo anterior de R$ 19.793.637.359,14 (dezenove
bilhões, setecentos e noventa e três milhões, seiscentos e trinta e sete mil,
trezentos e cinquenta e nove reais e quatorze centavos) desses créditos,
conforme registrado no Balanço Patrimonial de 2016.
Ressalte-se que o Tribunal de Contas dos Municípios do
Estado da Bahia, por intermédio dos Pareceres Prévios de 2013 a 2016, alerta o
município sobre a baixa arrecadação da Dívida Ativa.
(..)
As justificativas apresentadas pela Prefeitura demonstram
que há empenho para a recuperação dos créditos que lhes são devidos, sobretudo
os tributários. No entanto, não há como olvidar que o valor arrecadado da
Dívida Ativa do Município de Salvador, ano após ano, continua exíguo
comparando-o ao saldo crescente do estoque desses haveres.”
Para especialistas em direito e finanças publicas, a baixa
arrecadação de dívida ativa, ainda mais nos moldes reiterados pela Prefeitura
de Salvador, constitui, em tese, ato doloso de improbidade administrativa. Para
um especialista ouvido por A TARDE, sob condição de anonimato, “nem todo ato
omissivo na arrecadação de receita configura improbidade administrativa, mas
quando nos deparamos com uma sucessão dessas condutas por anos a fio, o gestor
pode ser enquadrado pelo artigo 10, inciso X, da Lei nº 8.429/92, já com a
redação dada pela recente Lei nº 14.230/2021, porque teremos um evidente caso
de ação ou omissão dolosa, que enseja, efetiva e comprovadamente, perda
patrimonial”.
Ao se deparar com os fatos apontados pelo TCM, a
Procuradoria e a Subprocuradoria da Câmara Municipal de Salvador, para fins de
subsidiar o voto que será lançado pela Comissão de Finanças, Orçamento e
Fiscalização do Legislativo soteropolitano, entenderam que eles já seriam
suficientes para ensejar a rejeição das contas de 2017, de responsabilidade de
ACM Neto. “Mais uma vez aqui, nota-se uma injustificada reincidência do
administrador público, em dissonância de 4 recomendações anteriores feitas pelo
próprio TCM-BA. A ausência de cobrança de dívida ativa denota grave renúncia de
receita, enquadrando-se como ato doloso de improbidade administrativa de acordo
com a jurisprudência pátria”, ressaltou o parecer da procuradoria parlamentar.
O artigo 10, inciso X, da Lei de Improbidade Administrativa é, tal como citado
pelo especialista ouvido por A TARDE, o cerne da discussão que deverá deixar
ACM Neto inelegível caso a Câmara de Salvador rejeite suas contas. O
dispositivo diz que:
Art. 10. Constitui ato de improbidade administrativa que
causa lesão ao erário qualquer ação ou omissão dolosa, que enseje, efetiva e
comprovadamente, perda patrimonial, desvio,
apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das
entidades referidas no art. 1º desta Lei, e notadamente:
X - agir ilicitamente na arrecadação de tributo ou de renda,
bem como no que diz respeito à conservação do patrimônio público;
Para concluir que o ex-prefeito teria agido
intencionalmente, o parecer emitido pelo setor jurídico do Legislativo
municipal assevera que “o dolo, por sua vez, está caracterizado pelo
comportamento reincidente do administrador público, que, mesmo após 4 advertências
consecutivas pela Corte de Contas, não promoveu iniciativas eficazes para
melhorar a arrecadação da dívida ativa, importando em omissão injustificável, e
consequentemente na perda patrimonial do erário”.
No opinativo, que será enviado para a Comissão de
Orçamento, os procuradores concluem que “a reiteração da conduta na baixa
cobrança de dívida ativa indicando renúncia de receita, também deve ser
enquadrada como ato doloso de improbidade administrativa (art. 10, inciso X da
LIA), sobretudo diante da reincidência da conduta do Gestor por 4 anos
consecutivos, mesmo após advertido pelo TCM-BA, consubstanciando em
irregularidade grave que merece a atenção deste Poder Legislativo”.
Repasses ao Terceiro Setor ainda pendentes de regularidade
A relação entre o Poder Público e o denominado Terceiro
Setor está hoje entre os maiores focos de corrupção e malversação de dinheiro
público. Ele é composto principalmente por entidades civis sem fins lucrativos,
Organizações Sociais – OS e Organizações Sociais de Interesse Público – OSCIP.
A própria prefeitura de Salvador já foi alvo da Operação
Kepler, que desarticulou um esquema criminoso de fraude à licitação,
superfaturamento, desvio de recursos públicos, peculato e lavagem de ativos, na
contratação do Instituto de Gestão e Humanização (IGH) para gestão complementar
de unidades de saúde UPA e Multicentros, todas vinculadas à Secretaria de
Saúde.
Na primeira fase da batida policial, ainda na gestão de ACM
Neto, as investigações disseram que licitações eram direcionadas para
beneficiar um instituto contratado, o qual terceirizava, através de contratos
superpostos e genéricos, parcelas do serviço a empresas recém constituídas e
vinculadas ao próprio instituto, tudo como claro mecanismo de retornar os
valores das subcontratações em benefício de seus representantes e para suposto
pagamento de propina a servidores vinculados à Secretaria de Saúde.
Já em dezembro de 2021, houve nova busca e apreensão na
pasta respectiva e na sede do IGH, sendo identificados, até aquele momento,
pagamentos, em razões das contratações fictícias, que ultrapassaram R$ 2
milhões de reais. As investigações apontaram ainda para a existência de
superfaturamento de cerca de R$ 8 milhões de reais, com potencial de desvio
ainda maior, vez que que os contratos continuam em vigência e plena execução.
Especificamente ao que o TCM apreciou sobre a relação da
prefeitura de Salvador com o Terceiro Setor, a Corte de Contas ao analisar as
contas de 2017 asseverou o seguinte:
“A Prefeitura Municipal repassou, no exercício de 2017,
consoante informações inseridas no sistema SIGA, recursos na ordem de R$
44.570.885,51 (quarenta e quatro milhões, quinhentos e setenta mil, oitocentos
e oitenta e cinco reais e cinquenta e um centavos) para Entidades Civis sem fins
lucrativos, Organizações Sociais – OS e Organizações Sociais de Interesse
Publico - OSCIP, a título de subvenção social ou auxílio, mediante convênio,
acordo, ajuste ou outro instrumento congênere.
Do montante dos recursos repassados, o valor de R$ 37.992.478,60
refere-se a recursos próprios e R$ 6.578.406,91 de vinculados.
O Relatório da Controladoria do Município – CGM (item n. 8)
destacou a quantidade de processos examinados, bem como os procedimentos de
diligência para sanar irregularidades, conforme demonstrado a seguir: Foram
analisados, no exercício de 2017, 475
processos relativos a recursos transferidos às entidades sem fins
lucrativos, mediante convênio de subvenção social, auxílio e contribuições,
sendo validados 85 processos de prestações de contas e diligenciados aos
respectivos órgãos concedentes, por irregularidades detectadas, 327 processos.
Foram ainda analisados e diligenciados 63 (sessenta e três)
processos de solicitação de formalização de novos convênios e/ou aditivos.
Após análise dos processos de formalização e de prestação
de contas, verificou-se desconformidades e emitiu-se diligências para
regularização das pendências encontradas. (sic)
A manifestação desta Corte de Contas acerca da regularidade
das prestações de contas dos recursos repassados será formalizada em momento
oportuno, por meio de processo autônomo, selecionado na matriz de risco
elaborada pela Superintendência de Controle Externo.” (trecho do Parecer Prévio
nº 03498e18, emitido pelo TCM)
Ao analisar novamente o tema, a procuradoria jurídica da
CMS entendeu que os fatos narrados pelo tribunal ensejam a rejeição das contas
de 2017. “O que chama a atenção neste item é justamente a quantia repassada
para Entidades Civis sem fins lucrativos, Organizações Sociais – OS e Organizações
Sociais de Interesse Público – OSCIP, no importe de R$44.570.885,51 (quarenta e
quatro milhões, quinhentos e setenta mil, oitocentos e oitenta e cinco Reais e
cinquenta e um centavos), sendo que, dos 475 (quatrocentos e setenta e cinco)
processos analisados, apenas 85 foram validados, e 327 processos foram
diligenciados para sanarem irregularidades”, ressaltou o opinativo
jurídico-cameral. Ainda sobre esse tema, o parecer da procuradoria foi
enfático:
“Ou seja, 68,84% dos processos encontravam-se, até a
análise das contas pelo TCM-BA, irregulares, quantia significativa e que ao se
sujeitar à análise nesta oportunidade, fica evidente a péssima utilização dos
recursos públicos em benefícios de citadas entidades, sem a devida observância
dos parâmetros legais, em evidente conduta lesiva ao erário público. Como dito
anteriormente, não se pode perder de vista que o Poder Legislativo possui poder
fiscalizatório amplo, não se limitando as informações consignadas pelo Tribunal
de Contas para realizar seu julgamento de mérito das contas do Executivo. Neste
caso, como inexistia, até a época do julgamento, o referido processo autônomo
para análise dos recursos repassados ao terceiro setor, mostrou-se imperioso o
aprofundamento desta matéria por parte desta Procuradoria, se deparando, como
já se esperava, com diversas irregularidades, principalmente em ausência de
comprovação da efetiva prestação dos serviços, e valores pagos, muito além dos
praticados no mercado.
Por esse motivo, a ausência de comprovação da regularidade
dos recursos repassados para Entidades Civis sem fins lucrativos, Organizações
Sociais – OS e Organizações Sociais de Interesse Público – OSCIP no ano de
2017, importa em grave ofensa aos princípios da administração pública,
ofendendo o art. 10, da LIA, sendo passível de responsabilização do Gestor,
ante sua conduta dolosa.”
Conclusão do parecer da Câmara Municipal pede rejeição de
contas
O parecer obtido com exclusividade por A TARDE e que deu
origem à matéria especial desta edição,
emitido pela Procuradoria Jurídica da Câmara de Vereadores de Salvador, não é
vinculativo, mas indica as diretrizes que deverão ser seguidas pela Comissão de
Finanças, Orçamento e Fiscalização.
Nesse arrazoado detectou-se “graves irregularidades
praticadas no exercício financeiro de 2017, sobretudo diante da reincidência do
gestor em não acatar recomendações anteriores do TCM-BA; omitir-se na melhoria
da arrecadação da dívida importando em perda patrimonial ao Município;
deficiência da formulação das peças orçamentárias de maneira reiterada;
contínuo gasto elevado e injustificado com publicidade, com manipulação dolosa
de informações perante o TCM e da ausência de comprovação dos repasses feitos
ao Terceiro Setor”, concluindo em opinar “à Comissão de Finanças, pela rejeição
das contas anuais do exercício financeiro de 2017, da Prefeitura Municipal de
Salvador, de responsabilidade de Antônio Carlos Peixoto de Magalhães Neto, em
virtude da prática de irregulares insanáveis que configuram, em tese, atos
dolosos de improbidade administrativa”.
Inelegibilidade
Nem toda rejeição de contas por uma Câmara Municipal
resulta em inelegibilidade. A matéria é regulada pela Lei Complementar nº 64/90
e diz que somente ficará inelegível aquele gestor que tiver as contas
rejeitadas “por irregularidade insanável que configure ato doloso de
improbidade administrativa”. No caso do ex-prefeito ACM Neto, o parecer
jurídico encaminhado para as mãos de Marta Rodrigues, presidente da Comissão de
Finanças, Orçamento e Fiscalização, se acolhido pela maioria qualificada do
Plenário antes do dia das eleições (02 de outubro), o tornará impedido de
concorrer ao Governo do Estado esse ano e a qualquer cargo nos próximos oito
anos, algo assemelhado com o que ocorreu com o ex-presidente Luiz Inácio Lula
da Silva as vésperas do pleito de 2018, quando o Tribunal Superior Eleitoral
(TSE) reconheceu sua inelegibilidade, indeferiu seu registro e o obrigou a
substituir seu nome pelo do ex-prefeito de São Paulo Fernando Haddad, que
terminou perdendo a disputa para Jair Bolsonaro.
Com o clima acirrado na Câmara de Vereadores de Salvador e
considerando que a votação das contas anuais deve ser secreta, nenhum analista
político é capaz de prever o que pode vir a acontecer com ACM Neto, caso Marta
Rodrigues (PT) libere seu voto pela rejeição das mesmas e Geraldo Junior (MDB)
as coloque em pauta, sobretudo nesse momento de "guerra" na relação
entre o Legislativo e o Executivo Municipais. Para além do impasse sobre a
iminente inelegibilidade de ACM Neto já para 2022, políticos estão convictos de
que se a base do governo conseguir postergar o julgamento das contas para
depois das eleições, o futuro político do cacique Magalhães dependerá do seu
desempenho nas urnas: se perder a eleição desse ano, a CMS o enterra de uma vez
por todas.
Redação: A Tarde